A transição energética é um dos principais assuntos da agenda climática que mobiliza países de todo o mundo. Fundamental para diminuir a emissão de gases do efeito estufa, ela consiste em uma mudança na forma de produção e consumo de energia em diferentes frentes, como o transporte e a indústria.
Quando se trata de transição energética no Brasil, pode-se dizer que o país já está à frente da maior parte dos demais, com potencial para alcançar suas metas em relação ao tema e até mesmo apoiar o restante do mundo, tornando-se protagonista nessa discussão.
Considerando a relevância do tema, neste artigo vamos explicar melhor o que é transição energética e como ela funciona, quais são as fontes de energia que devem predominar nesse novo cenário e quais são as oportunidades e desafios do Brasil diante do contexto global. Continue a leitura e saiba mais!
Provavelmente você já ouviu falar em termos como descarbonização e economia de baixo carbono, não é? Eles tratam da necessidade de redução da emissão do dióxido de carbono, um dos principais gases do efeito estufa, cujo aumento impacta no aquecimento global e nas mudanças climáticas.
O carbono, assim como os demais gases do efeito estufa, é gerado todos os dias em todo o mundo, sendo emitido a partir da queima de combustíveis fósseis, como petróleo e carvão, que são usados na indústria, nos transportes, na geração de eletricidade e em outras demandas de energia.
Dados de 2020 da IEA (Agência Internacional de Energia), por exemplo, mostram que, naquele ano, a matriz energética mundial era composta por cerca de 80% de fontes não renováveis, ou seja, justamente pelos combustíveis fósseis cuja queima resulta na emissão do carbono.
O problema é que se o mundo continuar nesse ritmo, a temperatura do planeta deverá seguir aumentando — especialistas sugerem que poderá subir 3,4°C até 2100 —, trazendo mudanças climáticas e fenômenos extremos, como furacões e grandes secas, além de outros reflexos.
Diante desse cenário, a transição energética é vista como um dos principais pilares para diminuir a emissão de carbono: ela consiste na substituição das fontes não renováveis de energia, como gás natural, carvão e petróleo, por fontes renováveis, a exemplo da energia hidráulica, solar e eólica.
Nesse contexto, o Brasil ganha lugar de destaque. Isso porque sua matriz energética é diversificada e, de acordo com o BEN (Balanço Energético Nacional) de 2023, 47,4% da oferta de energia já é gerada por meio de fontes renováveis, destacando-se a biomassa da cana (15,45%) e a hidráulica (12,5%).
Importante ressaltar que a geração de eletricidade no Brasil se sobressai ainda mais no cenário de transição energética. Também de acordo com o BEN, 61,9% da eletricidade usada no país é gerada a partir de hidrelétricas, ou seja, uma fonte renovável. Na maior parte dos países é o carvão a principal fonte de energia para eletricidade.
Diversas fontes de energia renováveis podem ser utilizadas para substituir os combustíveis fósseis e promover a transição energética. Na prática, o seu uso depende das características de cada local, ou seja, da oferta de cada fonte de energia para atender a demanda. Abaixo, veja quais são as principais!
Tendo como fonte de energia o movimento e a força da água, a energia hidráulica é a principal fonte de eletricidade no Brasil há décadas, considerada uma tecnologia madura, confiável e flexível, de acordo com a EPE (Empresa de Pesquisa Energética). No país, aliás, a abundância de recursos hídricos a torna vantajosa, embora períodos de seca possam comprometer a entrega.
De acordo com a Aneel (Agência Nacional de Energia Elétrica), o Brasil tem 219 usinas hidrelétricas de grande porte, como Itaipu, além de outras menores. Já segundo a EPE, mais de 60% do potencial hidrelétrico do Brasil já foi aproveitado e grande parte do potencial ainda não utilizado está no Norte do país.
Somadas as fontes solar fotovoltaica e térmica, a energia solar representa 1,2% da oferta de energia no Brasil, segundo o BEN, que também aponta aumento de capacidade instalada de 82,4% no país entre 2021 e 2022. As características brasileiras, com sol abundante na maior parte do país e em quase todo o ano, são vantajosas para o setor.
Aliás, o Marco Legal da Microgeração e Minigeração Distribuída regulamentou a geração de energia solar em casas, empresas, condomínios e outros estabelecimentos. Segundo a Aneel, esse tipo de geração de energia cresceu exponencialmente na última década: de 449,80 kW de potência instalada em 2012 para 7.371.655,18 kW em 2022.
O avanço da tecnologia nas últimas décadas tem contribuído para que a energia eólica, gerada a partir do vento, também cresça no Brasil, que dispõe de grande potencial no setor. Em relação à matriz elétrica, a energia eólica já corresponde a 11,8% da geração total, conforme o BEN 2023. Já no contexto da matriz energética, ela representa 2,3%.
Segundo a Abeeólica (Associação Brasileira de Energia Eólica), o Brasil tem 890 parques eólicos em 12 estados, principalmente na região Nordeste. A regulamentação da estrutura offshore, que trata de parques eólicos instalados no mar, deve trazer ainda mais investimentos para o setor e, neste caso, em todo o litoral brasileiro.
A energia de biomassa é gerada a partir da queima de uma matéria orgânica ou dos gases de sua decomposição. No Brasil, a biomassa da cana de açúcar é a principal fonte renovável de energia, de acordo com o BEN 2023, já que representa 15,3% da oferta interna de energia. E há ainda a lixívia e outros tipos de biomassa que complementam esse índice.
O país tem grande potencial para a geração com a biomassa e, por isso, a tendência é que o setor cresça ainda mais nas próximas décadas, contribuindo para a diversificação da matriz energética. Muitos produtores utilizam a energia gerada para autoconsumo, mas é possível ainda encaminhar o excedente para o sistema elétrico nacional.
Diante da necessidade da transição energética no Brasil para frear as mudanças climáticas e também do potencial do país na produção de diferentes tipos de energia renováveis, o poder público tem criado políticas públicas e oferecido incentivos para estimular a produção desse tipo de energia.
Esse movimento começou há décadas com diferentes dispositivos, a exemplo do Proinfa (Programa de Incentivo às Fontes Alternativas de Energia Elétrica), de 2002, criado justamente para promover a diversificação da matriz elétrica. Com a medida, o poder público conseguiu fomentar os primeiros produtores de energias renováveis no país.
Incentivos fiscais também são uma prática utilizada para estimular os investimentos na área, como a criação da Lei nº 13.097, de 2015, que zerou as alíquotas de impostos para vendas e importação de partes utilizadas em aerogeradores instalados em parques eólicos.
A ausência da cobrança no serviço de distribuição da eletricidade gerada a partir da energia solar, hoje chamada de “taxação do sol”, também serviu de impulso para que os sistemas fotovoltaicos começassem a ser instalados, com crescimento significativo na última década.
Mais recentemente, os leilões e as alterações nas regras do mercado livre também têm tornado o segmento mais atrativo. Já os financiamentos, principalmente com o BNDES (Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social), auxiliam quem quer investir com juros a longo prazo.
Além disso, o avanço da regulação em relação aos diferentes segmentos é outra medida que garante segurança jurídica e atrai investimentos, a exemplo do Marco Legal da Microgeração e Minigeração Distribuída, sancionado em 2022.
Ao mesmo tempo em que se destaca no cenário mundial, a transição energética no Brasil enfrenta desafios. Em se tratando da energia elétrica, por exemplo, o país ainda é muito dependente das hidrelétricas e precisa diversificar suas fontes de energia.
Afinal, como a geração de energia hidrelétrica está suscetível aos recursos hídricos, períodos de seca podem ocasionar o acionamento de bandeiras tarifárias e até apagões. Além disso, as termelétricas movidas a combustíveis fósseis são usadas como alternativa em períodos de pouca chuva, o que aumenta a emissão de gases do efeito estufa.
Um desafio ainda maior, porém, é o setor de transportes, que representa 33% do consumo de energia no país, segundo o Balanço Energético Nacional. Diesel e gasolina encabeçam a lista dos combustíveis fósseis usados no setor (71,7%), o que demonstra a necessidade de estimular o uso de biocombustíveis e também da eletricidade.
Já as oportunidades são inúmeras, vão além do potencial do Brasil em relação aos recursos naturais, incluindo investimentos e políticas públicas voltadas ao setor. Com isso, os reflexos tendem a ser não apenas ambientais, mas também sociais e econômicos, com a criação de empregos, por exemplo, e a pesquisa e desenvolvimento de novas tecnologias.
Além disso, muitas empresas e organizações têm buscado reduzir a sua pegada de carbono e estimular o investimento na área com o financiamento de projetos que contribuam para a transição energética, muitas vezes com requisitos sociais, como o acesso à energia e a disponibilidade de energia limpa em comunidades vulneráveis.
Como constatado, a transição energética é uma necessidade para frear o aquecimento global e todas as mudanças climáticas que podem impactar o futuro próximo. E o Brasil tem lugar de destaque, com potencial para se tornar protagonista nessa discussão.
Para garantir sucesso na transição energética e alcançar as metas estabelecidas para os próximos anos, o Brasil ainda precisa de avanços. Mas o cenário mostra que não faltam oportunidades para o país contribuir de forma significativa para a agenda climática global.
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Fernando Mussnich é Gerente Executivo de Comercialização de Energia e Originação de Negócios da EDP Brasil. Conta com 20 anos de experiência no mercado de energia atuando a frente de áreas comerciais, trading e originação de negócios com produtos energéticos e produtos financeiros. Formado pela Universidade Paulista (Unip), tem MBA em Administração de Empresas pela Fundação Getúlio Vargas (FGV) e MBA Executivo em Administração e Negócios pelo Insper. Fernando Mussnich escreverá sobre Mercado Livre.
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